Testemunho de Vida Àlvaro Costa


“Falar de Angola é meu prazer, foi lá que passei a minha infância e adolescência. Estudei na Escola Industrial de Luanda, tinha 10 anos cheguei aquela cidade. Estudei até à 4ªclasse na missão de São Paulo, meus colegas eram quase todos africanos. Depois entrei na Escola Industrial e tenho lindas recordações, tantas que neste mês de maio e dia 25 se realiza todos os anos o almoço com os mesmos. Vêm de lá alguns colegas que conviveram comigo e ainda hoje nós temos uma grande amizade. Nunca pensei sair de África infelizmente por razões de segurança dos meus filhos nascidos naquele país, tive que regressar com muita pressa e abandonar aquela terra que foi o meu berço. Devo dizer que as saudades são imensas. E as recordações são muitas. Meus pais tinham um restaurante, o cozinheiro e o ajudante era, africanos, em 30 anos que lá residi conheci muitos que lá trabalharam, ao domingo minha mãe fazia questão de os juntar a almoçar no quintal, uma mesa grande e todos confraternizavam connosco, era um convívio muito bonito sem diferenças de cores e de raças porque eles eram iguais a nós seres humanos excelentes. Terminado o meu curso de escola, fui trabalhar para o laboratório de engenharia de Angola, continuei a crescer com pessoas africanas, não tive nunca problemas, todas as brincadeiras eram praticadas com muita camaradagem e respeito. Em 1974 começou a guerra aí foi doloroso mas eles sempre me protegeram, houve uma altura em que acabaram os combustíveis ,a comida, a cerveja e havia ataques entre os dois partidos, não havia transportes, ia trabalhar a pé, e por duas vezes fui surpreendido por tiroteios, uma vez passava por um moceque (o que nós chamamos cá bairros) e eles vieram ajudar quando viram o tiroteio e não me deixaram continuar a caminhar, fiquei com eles até acabar o tiroteio.
Foi triste chegava cá (Portugal) apenas com para criar e com uma muda de roupa para cada um, tudo aquilo que conseguimos naquela terra ficou para aqueles que mais tinham convivido connosco como o colega do meu laboratório e alguns amigos de peito.
Tornei lá ao fim da guerra eles me receberam como o grande amigo que sou. Minha consciência de nade me acusa apenas sinto revolta por ter acontecido tudo isto, que ainda estaria a viver lá com meus filhos que nasceram em Luanda e minha esposa que amava aquela terra. Minha neta pede-me para lhe contar histórias de África, são muitas. Davam para escrever livros, se fosse um bom escritor. Optei por contar parte das minhas vivências naquela terra maravilhosa. Quero dizer que os africanos nesse tempo eram pessoas humildes de bom trato como os portugueses, hoje mantenho amizade com muitos.
Sobre a ideia que eles tinham sobre a Europa, há quarenta anos não se falava nisso e muitos deles visitaram Portugal, gostavam de vir passar férias, aqueles que trabalhavam vinham de férias e gostavam muito dos portugueses.
Termino por dizer que gostei muito do meu tempo em Angola.”
Com o testemunho do senhor Álvaro Costa podemos então ver que as relações entre os portugueses e as suas colónias, maioritariamente eram normais e de uma amizade única no que se trata de relações entre pessoas de diferentes raças e de um país que controlava o outro. Infelizmente com a guerra muitos portugueses tiveram de regressar a Portugal como consequência de tal, no entanto, vemos que essas mesmas amizades conseguiram suportar uma guerra e ainda hoje o senhor Álvaro mantém contacto com aqueles que comiam à sua mesa nos almoços de domingo.