Memórias Paula Mourão
Todos os dias, sempre que chego a casa e abro a porta, a primeira coisa que vejo é um quadro.
Foi um presente de um amigo de família, que nos deixou como sua recordação, após a sua despedida.
Quando os meus pais ainda viviam no Brasil, eles conheceram um homem chamado Amit.
Ele era de Angola e se tinha mudado para o Brasil (não sei o motivo), onde ele trabalhava numa oficina de jangadas. Mas em casa, ele usava a garagem para pintar as suas memórias.
Os meus pais conheciam-no porque ele alugava uma das casas do meu avô.
E como as casas eram muito próximas umas das outras, todos os domingos, sempre que o meu pai fazia um churrasco para assistirem ao jogo do Atlético, Amit era sempre convidado para a festa.
Muitas gargalhadas eram partilhadas e assim uma amizade se foi formando.
Anos mais tarde, os meus pais mudaram-se para Portugal.
Já que o meu pai recebeu uma proposta de emprego irrecusável.
Sendo assim, os meus pais mudaram-se para Portugal e Amit continuou a viver no Brasil pelos próximos sete anos, sempre mandando notícias.
Até que Amit também se mudou para Portugal, porque era mais fácil e mais barato para visitar a sua família em Angola.
Com a ajuda dos meus pais, ele conseguiu um emprego, desta vez como pedreiro, e uma casa por baixo da nossa.
Nesta altura eu já era nascida e tinha seis anos.
Sempre que podia, eu passava as tardes na casa de Amit. Por vezes ia com o meu irmão, outras sozinha.
No presente, eu não me lembro muito bem da sua cara, ou da sua voz. Mas lembro-me muito bem daquilo que ele me ensinou.
Também me lembro da casa dele. As paredes eram amarelas e a maioria era coberta por tapeçarias ou quadros coloridos com imagens de África.
A casa parecia que tinha sempre alguém na cozinha a fazer algum tipo de cozinhado que me era desconhecido.
Sentávamos sempre no sofá ou no chão, onde eu traçava os padrões do tapete.
Ele contava-me histórias, ou ouvíamos música ou então eu ficava a observá-lo enquanto ele trabalhava nos seus quadros, ou umas peças estranhas que eu nunca percebi muito bem o que eram , apenas que algumas até chegavam a ser assustadoras.
Na sala havia uma secção com várias fotografias da sua família, e eu fazia várias perguntas:
Quem são? O que estavam a fazer? Onde estavam?
E ele sempre respondia com um olhar e tom longínquo, devido às saudades de casa.
Porém, a tradição dos domingos com os meus pais sempre se manteve.
Depois do almoço eles permaneciam na mesa redonda e falavam sobre assuntos, que com a minha idade, não era capaz de compreender.
Hoje eu perguntei à minha mãe sobre o que eles falavam. E os assuntos eram muito variados.
Falavam sobre memórias em conjunto no Brasil, política, etc.(...), mas principalmente sobre as dificuldades que eles tinham em adaptar-se a Portugal.
Falavam sobre as coisas que as pessoas diziam nas suas costas. A hostilidade e o preconceito para com os africanos e brasileiros.
E era algo que acontecia tão frequentemente que Amit fartou-se e foi juntando dinheiro pelos próximos dois anos quando finalmente conseguiu regressar à sua casa, em Angola.
Com o passar dos anos, eles foram perdendo contacto.
Não sabemos onde ele está, ou o que ele faz, ou se ele construiu uma família.
Mas hoje eu continuo a reviver a sua memória através do quadro na minha sala.
Foi um presente de um amigo de família, que nos deixou como sua recordação, após a sua despedida.
Quando os meus pais ainda viviam no Brasil, eles conheceram um homem chamado Amit.
Ele era de Angola e se tinha mudado para o Brasil (não sei o motivo), onde ele trabalhava numa oficina de jangadas. Mas em casa, ele usava a garagem para pintar as suas memórias.
Os meus pais conheciam-no porque ele alugava uma das casas do meu avô.
E como as casas eram muito próximas umas das outras, todos os domingos, sempre que o meu pai fazia um churrasco para assistirem ao jogo do Atlético, Amit era sempre convidado para a festa.
Muitas gargalhadas eram partilhadas e assim uma amizade se foi formando.
Anos mais tarde, os meus pais mudaram-se para Portugal.
Já que o meu pai recebeu uma proposta de emprego irrecusável.
Sendo assim, os meus pais mudaram-se para Portugal e Amit continuou a viver no Brasil pelos próximos sete anos, sempre mandando notícias.
Até que Amit também se mudou para Portugal, porque era mais fácil e mais barato para visitar a sua família em Angola.
Com a ajuda dos meus pais, ele conseguiu um emprego, desta vez como pedreiro, e uma casa por baixo da nossa.
Nesta altura eu já era nascida e tinha seis anos.
Sempre que podia, eu passava as tardes na casa de Amit. Por vezes ia com o meu irmão, outras sozinha.
No presente, eu não me lembro muito bem da sua cara, ou da sua voz. Mas lembro-me muito bem daquilo que ele me ensinou.
Também me lembro da casa dele. As paredes eram amarelas e a maioria era coberta por tapeçarias ou quadros coloridos com imagens de África.
A casa parecia que tinha sempre alguém na cozinha a fazer algum tipo de cozinhado que me era desconhecido.
Sentávamos sempre no sofá ou no chão, onde eu traçava os padrões do tapete.
Ele contava-me histórias, ou ouvíamos música ou então eu ficava a observá-lo enquanto ele trabalhava nos seus quadros, ou umas peças estranhas que eu nunca percebi muito bem o que eram , apenas que algumas até chegavam a ser assustadoras.
Na sala havia uma secção com várias fotografias da sua família, e eu fazia várias perguntas:
Quem são? O que estavam a fazer? Onde estavam?
E ele sempre respondia com um olhar e tom longínquo, devido às saudades de casa.
Porém, a tradição dos domingos com os meus pais sempre se manteve.
Depois do almoço eles permaneciam na mesa redonda e falavam sobre assuntos, que com a minha idade, não era capaz de compreender.
Hoje eu perguntei à minha mãe sobre o que eles falavam. E os assuntos eram muito variados.
Falavam sobre memórias em conjunto no Brasil, política, etc.(...), mas principalmente sobre as dificuldades que eles tinham em adaptar-se a Portugal.
Falavam sobre as coisas que as pessoas diziam nas suas costas. A hostilidade e o preconceito para com os africanos e brasileiros.
E era algo que acontecia tão frequentemente que Amit fartou-se e foi juntando dinheiro pelos próximos dois anos quando finalmente conseguiu regressar à sua casa, em Angola.
Com o passar dos anos, eles foram perdendo contacto.
Não sabemos onde ele está, ou o que ele faz, ou se ele construiu uma família.
Mas hoje eu continuo a reviver a sua memória através do quadro na minha sala.