Os vizinhos do João l
Da janela da sua casa, João observava os seus vizinhos. Eram uns vizinhos bastante peculiares, mas o João até gostava deles.
Quando, há dois anos atrás, deixou a casa em Lisboa para se mudar com os pais, ambos biólogos, para o selvagem Botswana, esperava um choque cultural muito maior. Apesar de ter deixado os amigos e uma grande parte da família em Portugal, João estava muito habituado a viajar - aos onze anos, já contava com mais países visitados do que anos de idade - e já tinha estado em Angola, o país de origem da mãe. Aquilo que mais incomodou o rapaz quando chegou a Gaborone, a capital do país, era precisamente a semelhança desta com os centros urbanos portugueses. Não era nada como nos filmes que viu. “Isto não é uma savana!”, dizia indignado aos pais. Onde estavam os elefantes, as girafas, as árvores que pareciam chegar aos céus?
Com o passar do tempo, João foi-se ambientando e, para sua satisfação, começou a ver que, afinal, a cultura era muito diferente. O pai e a mãe compravam frutos exóticos nos mercados, que se montavam nas ruas da cidade, e aos poucos começavam a experimentar novas receitas. Na escola, começava a fazer amigos, e com eles jogava coisas muito diferentes do tão tipicamente português futebol, como o jogo da Mamba e da Terra-Mar. Mas, às vezes, aborrecia-se. A casa bem equipada, com wi-fi e TV cabo, parecia-lhe igual a tudo o que já vira. Com quintal, tinha espaço para ter um cão, mas não uma zebra. Perto de casa havia um grande jardim, mas não tão grande como a colossal selva que via nos documentários de vida selvagem. Os dias passavam e o desejo do pequeno João de explorar a verdadeira natureza só aumentava.
Uma certa manhã, o sonho do menino foi, finalmente, concretizado. Depois de meses à espera que lhes fosse concedida autorização, os pais finalmente foram transferidos para Maun, a cidade que serve como porta de entrada para a maior reserva natural do país. Ao fim de uma semana, os três partiam rumo ao Delta de Okavango, o lugar que fazia João sonhar noite e dia. Ao fim de quase 10 horas de viagem, atravessaram finalmente o país e instalaram-se na pequena casa de madeira, decorada como se o tempo por lá não passasse. Uma paisagem muito verde e salpicada de azul surgia perante os olhos do rapaz. Sentiu-se tão feliz que era capaz de passar a vida a apreciar aquele lugar, onde facilmente conseguia ver hipopótamos aos milhares e onde o som dos pássaros nativos criava uma melodia de fundo digna de um filme sobre safaris.
E, de certo modo, assim fez. Sentia-se realizado, feliz e, sobretudo, livre. Ás vezes, por graça, dava nomes aos animais que normalmente passeavam perto da sua casa. Desenhava-os, em cores coloridas, e guardava os desenhos para poder recordar um dia. Às vezes, cumprimentava-os, como um vizinho que se preze deve fazer. No fundo, vivia agora em comunhão com todos os animais, sob um teto infinito em que, de noite, se acendiam tantas estrelas que não podia conta-las. Se gostaria de, futuramente, voltar a Portugal? “Não, porque a minha casa é aqui”.
Quando, há dois anos atrás, deixou a casa em Lisboa para se mudar com os pais, ambos biólogos, para o selvagem Botswana, esperava um choque cultural muito maior. Apesar de ter deixado os amigos e uma grande parte da família em Portugal, João estava muito habituado a viajar - aos onze anos, já contava com mais países visitados do que anos de idade - e já tinha estado em Angola, o país de origem da mãe. Aquilo que mais incomodou o rapaz quando chegou a Gaborone, a capital do país, era precisamente a semelhança desta com os centros urbanos portugueses. Não era nada como nos filmes que viu. “Isto não é uma savana!”, dizia indignado aos pais. Onde estavam os elefantes, as girafas, as árvores que pareciam chegar aos céus?
Com o passar do tempo, João foi-se ambientando e, para sua satisfação, começou a ver que, afinal, a cultura era muito diferente. O pai e a mãe compravam frutos exóticos nos mercados, que se montavam nas ruas da cidade, e aos poucos começavam a experimentar novas receitas. Na escola, começava a fazer amigos, e com eles jogava coisas muito diferentes do tão tipicamente português futebol, como o jogo da Mamba e da Terra-Mar. Mas, às vezes, aborrecia-se. A casa bem equipada, com wi-fi e TV cabo, parecia-lhe igual a tudo o que já vira. Com quintal, tinha espaço para ter um cão, mas não uma zebra. Perto de casa havia um grande jardim, mas não tão grande como a colossal selva que via nos documentários de vida selvagem. Os dias passavam e o desejo do pequeno João de explorar a verdadeira natureza só aumentava.
Uma certa manhã, o sonho do menino foi, finalmente, concretizado. Depois de meses à espera que lhes fosse concedida autorização, os pais finalmente foram transferidos para Maun, a cidade que serve como porta de entrada para a maior reserva natural do país. Ao fim de uma semana, os três partiam rumo ao Delta de Okavango, o lugar que fazia João sonhar noite e dia. Ao fim de quase 10 horas de viagem, atravessaram finalmente o país e instalaram-se na pequena casa de madeira, decorada como se o tempo por lá não passasse. Uma paisagem muito verde e salpicada de azul surgia perante os olhos do rapaz. Sentiu-se tão feliz que era capaz de passar a vida a apreciar aquele lugar, onde facilmente conseguia ver hipopótamos aos milhares e onde o som dos pássaros nativos criava uma melodia de fundo digna de um filme sobre safaris.
E, de certo modo, assim fez. Sentia-se realizado, feliz e, sobretudo, livre. Ás vezes, por graça, dava nomes aos animais que normalmente passeavam perto da sua casa. Desenhava-os, em cores coloridas, e guardava os desenhos para poder recordar um dia. Às vezes, cumprimentava-os, como um vizinho que se preze deve fazer. No fundo, vivia agora em comunhão com todos os animais, sob um teto infinito em que, de noite, se acendiam tantas estrelas que não podia conta-las. Se gostaria de, futuramente, voltar a Portugal? “Não, porque a minha casa é aqui”.